sexta-feira, 24 de setembro de 2010

TRAVESTIS E INSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO

Disponibilizamos algumas pesquisas que retratam a realidade das travestis brasileiras no que diz respeito à inclusão no mercado de trabalho.

Selecionamos algumas partes de textos e disponibilizamos a bibliografia antes da citação se alguém se interessar em ler os textos na íntegra (o que recomendamos). Os dados foram obtidos em pesquisas realizadas por entidades como o Ministério da Educação e universidades, dentre elas a USP, a UnB e a UFRGS.

A exclusão de travestis e transexuais do mercado formal de trabalho é um assunto tão importante que o Ministério do Trabalho organizou, no ano passado, o I Seminário de Políticas Públicas de Trabalho, Oportunidades e Previdência para Travestis e Transexuais, tendo como objetivo justamente problematizar a inclusão deste grupo.

Vale ressaltar que a intenção não é discriminar a prostituição nem as prostitutas, mas defender o direito à escolha profissional para travestis e transexuais a partir de políticas públicas que combatam a transfobia e garantam o acesso e a permanência na escola.

Para as pessoas que escolhem a Educação como campo de atuação, é importante pensar na relação entre a transfobia, a evasão escolar e a inclusão no mercado de trabalho. Vale comentar que as palavras “travesti” e “transexual” sequer aparecem nos PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais), nem na parte intitulada Orientação Sexual, nos Temas Transversais.
Ao final, incluímos o endereço de documentários produzidos pelo Núcleo de Direitos Humanos LGBT da UFMG sobre as Travestis e Transexuais de Belo Horizonte e Juiz de Fora.


REFERÊNCIA 01:



Peres, Wiliam Siqueira. Cenas de Exclusões Anunciadas: travestis, transexuais, transgêneros e a escola brasileira. IN: JUNQUEIRA, Rogério Diniz (org.). Diversidade Sexual na Educação: problematizações sobre a homofobia nas escolas. Brasília : Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, UNESCO, 2009. p. 246-247. (Coleção Educação para Todos, vol. 32)



(…)

É importante lembrar que quando uma travesti chega à escola, ela já viveu alguns transtornos na esfera familiar e comunitária, apresentando uma base emocional fragilizada que a impede de encontrar forças para enfrentar os processos de estigmatização e a discriminação que a própria escola, com seus alunos, professores, funcionários e dirigentes, exerce, dada a desinformação a respeito do convívio com a diferença e suas singularidades. A intensidade da discriminação e do desrespeito aos quais as travestis são expostas nas escolas em que desejam estudar leva, na maioria das vezes, a reações de agressividade e revolta, ocasionando o abandono dos estudos ou a expulsão da escola, o que conseqüentemente contribui para a marginalização, pois bem sabemos da importância dada aos estudos e à profissionalização em nossa sociedade.



Em minhas escutas e observações etnográficas tem sido freqüente ouvir histórias de travestis que reclamam por não terem conseguido estudar, não poderem fazer uma faculdade e exercerem uma profissão que lhes garanta a sobrevivência, sem terem que recorrer à prostituição. Em suas falas é freqüente ouvir reclamações por precisarem se prostituir por não conseguirem empregos ou oportunidades de renda, sobrando-lhes apenas a rua como possibilidade de ganhos financeiros. Porém, gostaria de clarificar que embora algumas travestis afirmem gostar de se prostituir, a maioria delas não se sente à vontade em ocupar esse lugar no mundo, reclamando da ausência de oportunidades de estudos e empregos, o que nos leva a desmistificar a crença segundo a qual travestis, transexuais e transgêneros seriam sinônimos de prostituição; outrossim, nos faz perceber que são empurradas para os espaços de batalha em conseqüência da violência estrutural (PERES, 2005b). Essas ocorrências da estigmatização e da discriminação, vividas por travestis, transexuais e transgêneros no ambiente escolar prejudicam a própria socialização dessas pessoas, que passam a ter um universo existencial bastante restrito. No gueto, elas ficam imersas em um contexto de opressão e marginalização que solicita a sua adequação a uma realidade bastante singular: o universo travesti, de uma complexidade de valores e significados próprios, marcados como expressão de vida infame (FOUCAULT, 2003).



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REFERÊNCIA 02:



MACDOWELL, Pedro de Lemos. Geografia do gênero: do (não) lugar de travestis e outros abjetos na cidade∗. Trabalho apresentado no XVI Encontro Nacional de Estudos Populacionais, realizado em Caxambu, MG. Brasil. 29 de setembro a 03 de outubro de 2008. Disponível em . Acesso em 13 de setembro de 2010. p. 6.

Trata-se da associação do dia à opressão por mecanismos tácitos de coerção social e a conseqüente restrição da vida social de pessoas transexuais e travestis ao período noturno, signo da prostituição (e, conseqüentemente, à rua como espaço de prostituição). É importante destacar que nem todas as travestis e mulheres transexuais se prostituem. Muitas exercem outras profissões e atividades. No entanto, é significativo o número de travestis (especialmente) que, não conseguindo outros tipos de empregos e atraídas não apenas pela possibilidade de bons rendimentos na “rua”, mas também pelas redes de sociabilidade que se formam entre travestis que se prostituem recorrem à prostituição como meio de sobrevivência. O caráter “ditatorial” da prostituição como imposição, aludido por Paula, é destacado pela associação generalizada feita pelo senso comum entre a condição de travesti e a prostituição. Some-se a isso que desde 2002 o próprio Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) traz em sua Classificação Brasileira de Ocupações as categorias “travesti” e “transexual” como sinônimas de “profissional do sexo”, profissão identificada pelo código 5198-05.

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REFERÊNCIA 03:



WOLFE, Barry Michael . Travestis Brasileiras. NUPRI – Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais – USP. Disponível em . Acesso em 13 de setembro de 2010.

Travestis Brasileiras

Barry Michael Wolfe

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Prostituição

A discriminação efetivamente barra a maioria das travestis do sistema educacional e de carreiras de classe média.

O mercado formal de trabalho é basicamente fechado às travestis. Uma minoria bem pequena tem formação superior ou qualificações profissionais. Com poucas exceções, as únicas profissões abertas são enfermeiras, empregadas domésticas, cabeleireiras, entretenimento em boates gays e prostituição. Em muitos casos, cabelereiras, empregadas domésticas e artistas da noite fazem bico na prostituição.

As travestis muitas vezes são rejeitadas pelas famílias e expulsas de casa, e podem começar a trabalhar na prostituição com 12 anos.

Os clientes das travestis são geralmente homens que se apresentam como heterossexuais na vida normal. Muitos, se não a maioria, são casados.

No Brasil, ao contrário do que muitos pensam, na maioria dos casos, a travesti faz o papel ativo na relação sexual.



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REFERÊNCIA 04:



JIMENEZ, Luciene; ADORNO, Rubens C. F. O sexo sem lei, o poder sem rei: sexualidade, gênero e identidade no cotidiano travesti. Cad. Pagu [online]. 2009, n.33, pp. 343-367. ISSN 0104-8333.

Entre dez a vinte e cinco travestis, vários adolescentes, conviviam cotidianamente, relatando histórias de vida em que a entrada na prostituição era apenas parte de um universo permeado pelo sentimento de exclusão dos espaços socialmente reconhecidos e valorizados. (p., 346).

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REFERÊNCIA 05:



http://www.direitoshumanos.etc.br/index.php?option=com_content&view=article&id=2237:ensino-profissional-pode-chegar-a-travestis&catid=41:lgbtt&Itemid=17(...)

A maioria dos travestis não consegue emprego formal por preconceitos por conta de sua apresentação física e vai para a prostituição”, diz Eduardo Santarelo, coordenador do programa Brasil Sem Homofobia, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos. “A gente não quer que essa seja a única opção”, completa. Ele afirma que muitos travestis e transexuais sequer completaram o ciclo escolar básico, já que muitos se sentem estimulados a fugir da escola e ir para as ruas por conta do preconceito.

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REFERÊNCIA 06:



PELUCIO, Larissa. Três casamentos e algumas reflexões: notas sobre conjugalidade envolvendo travestis que se prostituem. Rev. Estud. Fem. [online]. 2006, vol.14, n.2, pp. 522-534. ISSN 0104-026X.

(…)

travestis costumam ter uma trajetória de vida que as distancia dos padrões de comportamento considerados adequados para certas faixas etárias, mesmo entre camadas populares. Saem cedo de casa, em torno dos 14 anos. Geralmente, iniciam aí uma vida noturna sustentando-se pela prostituição. (p. 527).

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Referência 07:



GARCIA, Marcos Roberto Vieira. Prostituição e atividades ilícitas entre travestis de baixa renda. Cad. psicol. soc. trab. [online]. 2008, vol.11, n.2, pp. 241-256. ISSN 1516-3717.

Entre as travestis estudadas, a prostituição aparecia, assim, não somente como motivada pela necessidade econômica, mas também como um espaço de afirmação da feminilidade, observação concordante com as realizadas por Kulick (1998) e Benedetti (2000), que vêem a prostituição como um campo de experiências prazerosas para as travestis, certamente mais do que entre a maior parte das prostitutas mulheres:



R. [uma das pouquíssimas travestis do Grupo que não se prostituíam regularmente e que tinha um pequeno salão de cabeleireira, adquirido após um período vivendo na Europa] disse que tinha um “vício” em ir para a Avenida, mesmo não precisando mais do dinheiro. Contou que adorava ver os carros pararem, buzinarem para ela, que achava aquilo “o máximo”.



Isso explica também seu desprezo voltado aos clientes que buscavam por relações sexuais passivas nos “programas”, uma vez que, embora isso garantisse a satisfação das necessidades financeiras, não realizava aquelas de serem desejadas como “mulheres”. O “programa”, contudo, quando realizado com um cliente que buscava por sexo “ativo” e que as pagava satisfatoriamente, era visto como algo agradável. De forma semelhante, a falta de clientes era motivo de queixa da parte delas, não somente pelos problemas financeiros que gerava, como também por não proporcionar seu reconhecimento como “mulheres” desejáveis. Nesse sentido, a prostituição passa a ser um dos únicos contextos onde a travesti desenvolve a auto-estima, podendo ser elogiada, reconhecida, “cantada” e, ao mesmo tempo, ganhar dinheiro, como mostra Kulick (1998). Tal consideração, contudo, deve ser relativizada em função da “decadência” no mercado sexual, fonte de sofrimento intenso para as travestis investigadas, especialmente quando não conseguiam ganhar o suficiente para manter seu modo de vida. (p. 243).

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Referência 08:



FERREIRA, Rubens da Silva. A informação social no corpo travesti (Belém, Pará): uma análise sob a perspectiva de Erving Goffman. Ci. Inf. [online]. 2009, vol.38, n.2, pp. 35-45. ISSN 0100-1965.

Mas todo o investimento no corpo não se dá sem consequências. Participando de uma sociedade patriarcal em que os valores e os papéis sociosexuais estão historicamente bem definidos para homens e para mulheres, o corpo andrógino das travestis passa a constituir fonte de preconceito, com efeito direto sobre a cidadania desse segmento (FERREIRA, 2003a). Desse modo, a inserção no mercado de trabalho se dá de maneira precária, uma vez que lhes são relegadas colocações estereotipadas, sendo as mais frequentes nos ramos da estética, da gastronomia e do entretenimento. Para aquelas provenientes de famílias mais pobres, a prostituição se coloca como uma das poucas alternativas de geração de renda, se não a mais recorrente. (p. 38).





VÍDEOS



Belo Horizonte:


Juiz de Fora:


NOME SOCIAL DE TRAVESTIS E TRANSEXUAIS É INCLUÍDO NOS REGISTROS ESCOLARES DA REDE MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE

Em 18 de dezembro de 2008 entrou em vigor a RESOLUÇÃO CME/BH Nº 002/2008, que dispõe sobre os parâmetros para a Inclusão do Nome Social de Travestis e Transexuais nos Registros Escolares das Escolas da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte – RME/BH.  

Para ler a Resolução na Íntegra, acesse o link abaixo: